O jogo Far Cry 6 se passa em uma ilha chamada Yara, uma clara inspiração a Cuba, e traz o ator Giancarlo Esposito com o antagonista Antón Castillo. O início da apresentação de Far Cry 6 traz um lado bem interessante. Com uma estética digna de filmes da franquia 007, a abertura vai apresentar fatos do cenário do passo e do atual país Yara, cujas raízes se espalham nas revoluções que levou mais de 50 anos da família Castro no poder.
Nos últimos anos, a Ubisoft vem utilizando ideias de eventos ideológicos para estabelecer os temas de Far Cry e com ele, a liberdade de tocar o caos pelo mapa da maneira que achar melhor. Sinceramente não esperava ver algum tipo de reflexão sobre os temas no qual o jogo veio a se debruçar, ao trazer um lado tão pouco debatido quando se fala da Revolução Cubana nos dias de hoje: o do movimento que se levantou contra o imperialismo.
De fato, não é algo que eu esperava de uma franquia que, talvez, tenha atingido em Far Cry 5 foi o ápice do paradoxo de trazer um tema altamente político, mas no final não saber o que fazer com ele. Em uma época em que são cada vez mais difícil dizer que jogos sobre guerra “não são políticos”, a Ubisoft conseguiu fazer com que o jogador se aprofunde ao apresentar temas paras o desenvolvimento de seu personagem e o resultado é bem positivo - ainda que essa profundidade tenha passado do nível de um copinho de café para um copo americano. É pouco, mas até que é um progresso.
Imagem: Reprodução/Ubisoft |
Far Cry 6 tem a ideia de colocar o jogador no centro de uma guerrilha, o que explica a inspiração do palco que foi um dos maiores movimentos de guerrilheiros mais famoso do século XX. Mas essa história é um famoso “e se” do século XXI. Em Far Cry 6, Antón Castillo é eleito após mais de cinquenta anos do governo nascido de uma revolução de 1967 que libertou o país da tirania do pai dele, mas acabou resultando em um bloqueio econômico que fez o local se isolar e parar no tempo.
Castillo volta com força popular e econômica: no centro de sua plataforma de governo está a fabricação de um remédio chamado Viviro, extraído das plantas de tabaco yarenses, que se prova ser o mais eficaz tratamento de câncer do mundo. A fabricação da droga, no entanto, requer o manuseio de agrotóxicos letais. E qual é a solução do famoso El presidente? Transformar as plantações de tabaco em campos de trabalho forçado, para onde são enviados os opositores de seu regime.
No meio de toda essa algazarra, você é Dani Rojas, um jovem (ou uma jovem, fica a sua escolha) que foi expulso do exército yarense e deseja se refugiar em Miami nos Estados Unidos. Os planos acabam dando errado e você acaba caindo direto nas mãos da Libertad, uma guerrilha composta por ex soldados e civis que querem derrubar a opressão de Castillo.
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Relutante em se juntar à guerrilha, Dani vai pagando sua “dívida” ao ser acolhido pela guerrilha enquanto conhecer melhor as motivações dos correspondentes a Fidel Castro e Che Guevara: Clara García, a jovem líder do movimento, e Juan Cortez, ex-espião e mestre nas técnicas de guerrilha que se torna um “professor” do protagonista. Em Far Cry existe uma peculiaridade que é: desenvolver seus antagonistas e pouco seus aliados e até mesmo seu personagem principal. Mas em Far Cry 6 a fórmula foi mudada, o que acabou apagando bastante o papel de Antón Castillo (Giancarlo Esposito) no desenrolar do gameplay.
Desde Far Cry 3, justamente o último a dar um pouco de personalidade tanto ao protagonista quanto ao antagonista. Também sendo o primeiro a lançar a tendência de antagonistas dominantes com Vaas. Com o decorrer do gameplay você vai investindo e acreditando na história de Dani, Clara e os demais guerrilheiros da Libertad, quanto ao desenrolar de Castillo. Agora, quem acaba perdendo seu espaço nessa história acaba sendo o próprio vilão. Sempre que entra em cena, Castillo sempre faz uma performance teatral, cheia de discursos ensaiados e ações dramáticas que fazem com que a performance de Giancarlo Esposito seja apagada, mas ainda assim ele cumpre seu papel e entrega uma performance perfeita de vilão tirano.
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Outro personagem que acrescenta o tempero à história é Diego, o filho adolescente do ditador que é carregado a tiracolo por ele no decorrer de todo o jogo, em uma tentativa do pai de ensiná-lo a governar Yara com mão forte. Tal qual Dani, Diego também exibe relutância em trilhar o caminho apresentado por seu pai, e a transformação dessa dinâmica é um ponto bem interessante de acompanhar, ainda que aconteça de forma isolada por boa parte do game. Toda essa narrativa só é possível pela escolha criativa muito bem acertada da Ubisoft. Cenas com diálogos marcantes e cenas de ação memoráveis, e com personagens com motivações convincentes, fazem de Far Cry 6 um dos melhores jogos da franquia até agora.
As mudanças mais profundas que ocorreram em Far Cry 6 acabam acontecendo na parte narrativa, já que os segmentos interativos e as estruturas de jogo permanecem praticamente as mesmas e com leves alterações, se comparado aos antigos jogos da franquia. Isso, por si só já é a prova que Far Cry tem uma fórmula robusta de como manter sua gameplay sem se tornar enjoativa e repetitiva, mesmo mudando tão pouco e tendo tanto em comum com outros títulos da série de jogos. Como a maioria dos jogos de mundo aberto da Ubisoft atualmente, Far Cry 6 se divide em três grandes áreas que precisam ser liberadas da influência tirânica de Castillo, reforçada por seus ‘tenentes” cada um representando um dos lados do tripé que sustenta o lucrativo negócio do Viviro e de sua insana tirania.
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Assim, cada divisão do mapa tem seu arco narrativo próprio, e cada área é dividida em territórios menores. Puxado do jogo da série, Far Cry: New Dawn, vêm um sistema de nível de personagem que serve para direcionar a progressão da história, já que os territórios também têm níveis e estes vão aumentando à medida que o regime de Castillo é ameaçado. Infelizmente, os graus de dificuldade não são tão rígidos, o que acaba sendo relativamente fácil transitar pelas áreas de maiores níveis.
Em relação a progressão do personagem, ela é feita no melhor estilo guerrilha, sendo feita na base da gambiarra: além dos habituais recursos coletáveis que podem ser usados para modificar armas, a grande novidade está no Supremo, uma mochila customizável que dá um poder “especial” ao protagonista, desde uma saraivada de foguetes até a capacidade de tomar impulso em pleno com um jatpack improvisado. Far Cry 6 tem uma infinidade de atividades no mapa, que vão do desenvolvimento de acampamentos e caça de tesouros a um minigame de rinha de galo, que por sinal, a rinha de galo foi a coisa que mais me surpreendeu no game, por ser um “clube da luta” e que funciona perfeitamente. Mas, ao mesmo tempo, o foco está na liberdade de agir que sempre foi estabelecida na franquia, e cujo estilo caótico é favorecido pela estrutura de jogo oferecida.
Não posso deixar de falar dos nós “parças” que são nossos companheiros de exploração do protagonista, que já viraram marca registrada da franquia e retomam com representantes que vão do cômico ao adorável, eles são o crocodilo guapo, que usa uma camiseta, ou o adorável Chorizo, um cachorrinho salsicha que anda de rodinhas nas patinhas traseiras. Vale ressaltar também o cuidado do jogo com a acessibilidade, que, seguindo o exemplo de outros jogos de alto orçamento como The Last of Us: Parte II, traz diversos auxílios para pessoas com deficiência visual e/ou auditiva.
Imagem: Reprodução/Ubisoft |
Far Cry 6 é o primeiro jogo da série a ser lançado para a nova geração de consoles, assim como boa parte dos games lançados no início de uma nova geração de consoles, os detalhes técnicos destas plataformas não devem ser sentidos diretamente. O título foi testado em um Playstation 4 Pro o que seria equivalente a forma bem elevada, os gráficos são até bonitos, mas vem juntamente com uma quantidade absurda de bugs, como a missão não iniciar, ou ao interagir com um personagem ou com um objeto a ação simplesmente não funciona, o que simplesmente causa uma certa frustração e eu me vi várias vezes com vontade de desistir de jogar.
Far Cry é o título mais conservador da Ubisoft. Em meio a tantas polêmicas em que a produtora passa por um intenso processo de autocrítica na criação de seus jogos, especialmente os jogos de mundo aberto, ele traz uma certa mudança, mas ainda assim continua sendo o famoso “mais do mesmo”, o que faz com que as poucas mudanças apresentadas no game seja de extrema significância.
A mudança de perspectiva para a terceira pessoa durante as cutscenes aliada a um texto que te permite desenvolver um pouco melhor os temas abordados pela propaganda fazem de Far Cry 6, acima de tudo uma aventura mais honesta e autêntica que os últimos games da franquia. Mesmo sendo “mais do mesmo” o game soube explorar suas qualidades o que acabou se diferenciando dos demais jogos da franquia. Mas, não é algo que a maioria dos jogadores, mais interessados em atirar, pular, correr, e pilotar, vão buscar em um título como esse, mas a camada extra de profundidade e diversidade sempre será bem-vinda!
Far Cry 6 foi lançado no dia 7 de outubro para PC, PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One, Xbox Series X|S, Stadia e Luna. Esta review foi feito com uma cópia de PlayStation 4 Pro, cedida pela Ubisoft.