Crítica | Pinóquio


"Pinóquio" de Matteo Garrone finalmente chega aos cinemas e acaba deixando a desejar em muitos aspectos importantes.


Algumas histórias nasceram para passar por gerações e se consolidar em cada uma delas. Se pudermos nomear um clássico com essa característica, Pinóquio facilmente poderia assumir o posto. Ainda que originalmente sua história tenha ganhado vida dentro de um livro, foi na Disney que Gepeto e Pinóquio ganharam repercussão. 


Em 1883, Carlo Collodi resolveu dar vida a um personagem diferente de tudo que já havia sido visto. Mesmo que inicialmente a obra tenha servido para assustar crianças que optavam por mentir, é inegável que Pinóquio serviu de lição para todas as idades. 


Muitos entendem que após passar pela Disney, nenhum clássico literário se mantem em sua plenitude, sempre ocorrem mudanças bruscas no roteiro de cada história. O filme Pinóquio (2021) dirigido por Matteo Garrone (Dogman) foi lançado em 2019 na Europa e seu sucesso fez com que chegasse aos cinemas do mundo. Para entendermos o processo desse longa, precisamos destacar dois pontos: o primeiro é que a Disney romantizou o filme e o segundo é que a história real se diverge em muitos aspectos do que foi já foi contado. 



Matteo Garrone optou por uma imagem sombria e com características reais, o boneco famoso por suas artimanhas, segue sendo um ser questionável nessa história. O que na Disney vemos é a beleza da redenção e o final feliz traçado no primeiro segundo de filme, em Pinóquio, versão adaptada em 2021, podemos facilmente ver a tristeza do cotidiano como peça principal da história. 


Gepeto ganhou a voz de Roberto Benigni, vencedor do Oscar por A vida é bela, Pinóquio foi vivido por Federico Ielapi e Fada Azul por Marine Vacth. É interessante pensar nessas escolhas quando entendemos a origem da história de Pinóquio, escrita originalmente na Itália. 


No filme conseguimos ver de fato a história de Pinóquio sem amarras ou preocupação com o público que irá ver o longa, podemos entender de fato o que leva o boneco a ser uma das maiores obras produzidas. Isso tudo não isenta as ausências que o filme entregou, ainda que com muitas possibilidades, sentimos falta de entender a história em sua plenitude. 



O livro de Collodi mostra Pinóquio como um garoto ingênuo e mentiroso, o que o leva a ter o crescimento de seu nariz a cada mentira que contava. Isso tudo nos leva a perceber a primeira ausência do filme: o típico crescimento do nariz ao mentir. Ainda que com o crescimento presente no filme, isso só ocorre uma única vez e sem muita explicação. Vemos o início de uma parte importante para a construção do personagem de Pinóquio, mas não há o entendimento pleno do próprio boneco em ver seu nariz crescer e do telespectador de esperar que aquilo acontecesse mais vezes. 


A história mostra os desafios de Pinóquio ao procurar seu pai após ter desobedecido e fugido para a apresentação dos fantoches. A busca pelo seu criador foi intensa e até certo ponto a parte mais bonita do que podemos presenciar no filme. O que desmotiva completamente o telespectador é não poder entender de fato o encontro dos dois após duas horas de filme focado nisso. 



Gepeto cria o boneco com a madeira mágica que ganha de Cerejo, construção ótima para os leitores de Collodi, afinal a Disney alterou a parte no momento de contar a versão. Outro ponto positivo foi a escolha dos personagens que interpretaram o Gato (Rocco Papaleo) e a Raposa (Massimo Ceccherini), a produção ficou exatamente como lemos na história e com a medida certa de caos e humor. Garrone ainda consegue trazer o tom completamente artístico, com a beleza que só um diretor como ele poderia abordar de forma completa.


Na trama conseguimos perceber o arco precioso de Pinóquio e a construção de suas ações. Entendemos que ele passa pelo processo de errar, pagar por seu erro e aprender com ele. Ainda que com avisos diversos sobre suas ações, quem leu a história de Collodi, entende que não poderíamos apreciar nada se o boneco resolvesse ser perfeito. A criação do erro é fantástica em contraposição com as consequências. 


Garrone, por fim, buscou um filme diferente e até certo ponto sombrio. Pinóquio não é o melhor filme que encontramos nos cinemas em 2021, certamente não será a melhor adaptação da história de nosso boneco. Entretanto, Garrone não promete isso. A adaptação queria contar a história de um marceneiro que constrói seu boneco e cria um laço de pai de filho, que ao perdê-lo, não mede esforços para encontrá-lo. Ainda que com falhas visíveis, o filme entrega exatamente isso para o seu telespectador. 



Teremos mais uma adaptação da história com direção de Guillermo del Toro (A forma da água) para a Netflix, ainda que Garrone não tenha feito a melhor de suas entregas, Guillermo pode olhar para a construção e alterar o que não foi entregue. 


Mesmo que com pontos positivos e negativos, Pinóquio foi um grande lançamento para os cinemas, infelizmente acabará sentindo o impacto de ter sido lançado em meio ao caos de uma pandemia. O filme certamente teria um público maior se estivéssemos em tempos normais. O que fica para nós é o sentimento claro que Pinóquio nos passa: somente a verdade será capaz de nos proteger. 


Nota ⭐⭐ 3.5/5








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