Exibido na Quinzena dos Realizadores do 72º Festival de Cannes, 43ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, e no Festival Internacional de Cinema do Rio, o filme brasileiro SEM SEU SANGUE, primeiro longa de Alice Furtado, estreia na Netflix nesta sexta-feira, dia 20 de novembro.
O longa aborda a intensidade do primeiro amor a partir da perspectiva de Silvia (Luiza Kosovski), uma adolescente introspectiva e desinteressada pela rotina, que acredita ter encontrado em Artur (Juan Paiva) algo que a faça sentir-se mais viva. Ele surge inesperadamente em sua turma depois de ter sido expulso de várias escolas. Silvia fica fascinada pela vitalidade do garoto, que no entanto sofre de hemofilia, doença hereditária que impede o sangue de coagular corretamente. Os dois mergulham em uma convivência intensa, interrompida por um grave acidente, que vai abalar a vida da jovem.
A ideia para realização de SEM SEU SANGUE existe desde 2012, e vem de questionamentos que a diretora Alice Furtado tinha nessa época sobre o amor, o desejo, e sobre o que se passa com o corpo no momento em que se perde uma relação importante, principalmente quando se é jovem e isso se mistura com a descoberta do mundo e de si.
O filme narra o drama dessa adolescente que em dado momento, transforma-se em um filme de gênero, mais especificamente voltado para o horror. “2012 foi para mim uma época muito cinéfila, em que eu estava particularmente interessada no cinema de horror, em especial o horror clássico, dos anos 40, como os filmes de Jacques Tourneur que acabaram influenciando de várias formas diferentes o SEM SEU SANGUE. Achei que esses dois interesses se combinavam bem, e comecei a escrever a história da Silvia.”, compartilha a diretora Alice Furtado.
Assim que Alice Furtado decidiu contar a história de uma garota que recusa-se a perder o primeiro amor, a “ressuscitação” se impôs imediatamente como tema, e naquele momento pareceu impossível fazer SEM SEU SANGUE sem que o filme não reverencie o gênero do zumbi, as suas origens no cinema e na cultura de massa. O livro Magic Island, que a personagem Silvia encontra na casa de praia, talvez seja o marco original desse processo de mudança na narrativa do filme – um diário de viagens que, de forma bastante sensacionalista e questionável, apresentou a cultura do vodu haitiano ao resto do mundo e tornou-se extremamente popular, com suas histórias de mortos-vivos e feitiçarias.
“Achava importante também trazer para o filme os indícios dessa história de apropriação cultural, com todos os seus problemas. Silvia acha esse livro numa casa de praia que é toda decorada de objetos extraídos de seus contextos significantes, ali formando uma mera coleção de "exotismos". É um comentário paralelo no filme, mas que para mim era importante: mostrar as fontes levianas e equivocadas de onde a Silvia extrai "informações" para o seu ritual, sempre enviesadas pela apropriação de colonizadores que pouco conhecem sobre aquela cultura, e que dela se apropriaram por motivos questionáveis, como Silvia acaba também fazendo.”, contextualiza Alice Furtado.
Para além disso, em SEM SEU SANGUE, a protagonista Silvia tem uma “bruxa” dentro dela, e com isso é capaz de mover as forças da natureza ao seu redor de uma forma estranha e inexplicável. Como uma alegoria do desejo e dos seus poderes, muitas vezes destrutivos, toda a monstruosidade que há na história se origina no próprio desejo sem limites dessa menina, a própria figura diabólica que a assombra.
SEM SEU SANGUE foi inteiramente rodado nas cidades do Rio de Janeiro e Paraty. No Rio, a escolha das locações passou por lugares específicos e pouco explorados que fascinam a diretora, como a estação de São Cristóvão e o mangue da Barra, mas também lugares dos quais Alice Furtado tem uma memória afetiva forte, como o colégio onde estudou, o CAP/UFRJ. Em Paraty as filmagens foram nas praias e arredores de Trindade, que fora de temporada parecem bastante selvagens e praticamente desertas.
A trilha sonora composta por Orlando Scarpa Neto funciona como uma narrativa dentro do filme e sempre foi pensada dessa forma, muitas vezes a música em SEM SEU SANGUE vem ocupar um espaço que não está preenchido por mais nada, dando conta de emoções que extrapolam o que é visto na imagem e o que está dito pelos diálogos.
O filme é uma produção da Estúdio Giz, em coprodução com Oceano Cinematográfico, BALDR Film (Holanda) e Ikki Films (França). No elenco, Luiza Kosovski, Juan Paiva, Digão Ribeiro, Silvia Buarque, Lourenço Mutarelli, Ismar Tirelli Neto, Valentina Luz e Nahuel Perez Biscayart. A distribuição no Brasil é da Vitrine Filmes.