- Influenciador entra no debate político e se converte em ator central de grupo de oposição ao governo federal, mas não alinhado a bases partidárias
- Protestos antigoverno engajam perfis políticos, mas debate geral sobre a pandemia ainda se articula principalmente a partir de críticas à atuação do governo federal e a divulgação de dados sobre a evolução da Covid-19 no país;
- Núcleo de apoio ao governo federal mantém intensa atividade, mas em isolamento e sem atrair novos perfis, com enfoque em críticas aos protestos antigoverno;
No começo do debate geral sobre a pandemia de Covid-19 no país, o youtuber Felipe Neto se consolidou (acompanhando movimento digital iniciado nas eleições de 2018) como ator central de um grupo unificado de oposição ao governo federal, que reúne da esquerda à centro-direita, de Lula a João Doria. Esse grupo (em amarelo, no mapa abaixo) passou a congregar boa parte das bases políticas críticas ao presidente Jair Bolsonaro e se expandiu em alcance no Twitter, às vezes "capturando" perfis que não interagiam diretamente com atores políticos. E, a partir deste fim de semana, outro influenciador digital de peso entrou no debate político: Whindersson Nunes, que, ao se posicionar de forma clara em oposição ao governo, acabou atraindo para si perfis não alinhados a grupos partidários, mas contra as políticas atuais de combate à Covid-19, assumindo a posição de "líder" deste grupo (em rosa, normalmente fragmentado) e dividindo protagonismo antigoverno com Felipe Neto.
Somadas, as duas bases (amarela e rosa) chegam a 69% dos perfis do mapa de interações, percentual regular de organização dos grupos críticos ao governo federal na rede nos últimos meses. Impacto muito relevante da entrada de Whindersson na discussão política, contudo, é o fato de que pela primeira vez o grupo não alinhado, que apenas às vezes se "agregava" ao grupo amarelo, se organiza a partir de um influenciador direto, o que pode mudar de forma significativa o engajamento de oposição ao governo federal para além da política partidária via redes sociais. Apesar da mobilização digital para os protestos antigoverno, a agenda discursiva geral nas redes ainda se organiza, sobretudo, a partir do cotidiano da quarentena e do questionamento às ações do governo federal quanto aos dados da pandemia e do desrespeito da população ao distanciamento social e às medidas preventivas contra o coronavírus.
Ao mesmo tempo, o grupo azul, pró-governo, persiste com baixa capacidade de expansão, apesar da alta atividade -- 14% dos perfis, mas 35% das interações. Ainda em isolamento e dependente de interações internas, sem falar com os demais grupos, persiste em retroalimentação, enquanto um emergente grupo rosa a partir da atuação digital de Whindersson tem a capacidade de atrair novas contas que não costumam interagir em relação a assuntos de política nacional. O youtuber fez um tuíte sobre vacina (com o uso de um palavrão) de ampla viralização, e a postagem de sátira sobre o apoio ao governo federal obteve repercussão direta de perfis que, pela posição no mapa, estão distanciados de atores políticos de oposição e da própria rede de influência de Felipe Neto. São perfis que, caso permaneçam no debate digital, ampliarão o alcance da pauta científica, favorável ao isolamento social e de rejeição às medidas de flexibilização no país.