Steve Ditko, o artista norte-americano, morto em junho de 2018, poucos meses antes de completar 91 anos, criou o Homem-Aranha em parceria com o editor e roteirista Stan Lee, em 1962. Mas, seu papel não ficou restrito ao desenho, tampouco ao herói que virou símbolo da Marvel Comics. Sua imaginação privilegiada deu vazão a uma série de características dos personagens da série, inclusive os vilões, nos 39 números que desenhou, até 1965. O mesmo talento que o levou a dar vida, sozinho, a criaturas intrigantes como Doutor Estranho; bizarros, como o Rastejante; radicais, como Questão; e polêmicos, como Rapina e Columba.
Mesmo autor de Stan Lee – O reinventor de super-herois e Jack Kirby: O criador de deuses, Guedes imprime ao livro uma narrativa detalhada, porém ágil, em que resgata desde a infância de Ditko na acanhada Johnstown, estado da Pensilvânia, até sua consagração como coautor Aranha. Ele mostra a família pobre, as brincadeiras na rua, o serviço no exército americano, o tímido começo na área editorial em Nova York, e até mesmo o primeiro encontro com Stan Lee em uma escola de desenho.
Com certeza, o leitor irá se surpreender com as revelações da vida particular e da carreira dessa misteriosa e, ao mesmo tempo, fascinante personalidade da Arte Sequencial. O Incrível Steve Ditko apresenta uma enormidade de informações que não se vê em nenhuma publicação estrangeira, pois foram buscadas fora do âmbito das HQs.
Guedes esmiuça a personalidade e uma estranha filosofia que conduziu a vida do desenhista arredio e hermitão até seu ultimo suspiro. A partir de determinado momento de sua carreira, Ditko passou a escancarar suas ideias revolucionárias, muitas vezes classificadas como libertárias, nas páginas impressas. Principalmente nas publicações independentes, em que tinha completa autonomia.
Porém, para detectar com precisão suas intenções mais obscuras nos títulos das grandes editoras como Marvel, DC e Charlton Comics, Guedes teve de mergulhar em várias obras da filosofa russa Ayn Rand, propagadora da filosofia do Objetivismo, especialmente em livros como A Nascente (1943) e A Revolta de Atlas (1957), para descobrir verdadeiras “mensagens subliminares” nos trabalhos mais famosos de Ditko.
Adepto do Objetivismo de Rand desde os anos 1960, Ditko acabou por se transmutar, dali em diante, em bem mais que apenas um artista da indústria dos comics. Se tornou também um criador compulsivo, um filósofo espontâneo e um crítico implacável da sociedade moderna.
Desagradou muita gente da indústria dos quadrinhos. Rompeu com Stan Lee, oportunidades de trabalho foram perdidas e portas se fecharam para sempre. Amizades de longa data – como a que mantinha com o editor Dick Giordano – foram desmanteladas. Apesar de recluso, inacessível a entrevistas e pouco afeito à premiações e convenções de quadrinhos, Ditko jamais se furtou a defender seus rígidos, mas inteligentes pontos de vista.
O Incrível Steve Ditko revela ao público essa faceta praticamente desconhecida do biografado, de uma maneira sensível e reflexiva. Vem recheado de artes maravilhosas, e muitas até então inéditas em publicações brasileiras; com várias reproduções de originais do artista e fotos raras do biografado, em momentos distintos de sua vida.
A belíssima arte de capa foi realizada pelo cartunista Wander Antunes. Para completar, traz textos de Manoel de Souza (editor da revista Mundo dos Super-Heróis), Marcelo Naranjo (editor do site Universo HQ), Thiago Ferreira (apresentador do canal Comix Zone) e do editor do livro, Gonçalo Junior. Tudo isso, sob um arrojado design gráfico de André Hernandez, que garante um visual final impactante – digno dos quadrinhos de Steve Ditko.